Da Cidade de Goiás
Aberto na terça, 19, o XI Festival Internacional de Cinema e Vídeo Ambiental (Fica) reuniu realizadores goianos, brasileiros e estrangeiros, pesquisadores, professores e estudantes de audiovisual na Cidade de Goiás. De quarta a sábado, além de participarem de cursos e palestras, eles puderam colocar em perspectiva um recorte da produção internacional, nacional e local.
A reportagem da Tribuna aproveitou a presença deles para discutir a qualidade do cinema feito em Goiás, bem como a contribuição do festival para a melhoria dele. É inegável que, desde a primeira edição do Fica, em 1999, a produção goiana cresceu e outros eventos relacionados ao tema vieram no mesmo rastro. Esse lado positivo, porém, não evitou alguns efeitos colaterais.
A reportagem da Tribuna aproveitou a presença deles para discutir a qualidade do cinema feito em Goiás, bem como a contribuição do festival para a melhoria dele. É inegável que, desde a primeira edição do Fica, em 1999, a produção goiana cresceu e outros eventos relacionados ao tema vieram no mesmo rastro. Esse lado positivo, porém, não evitou alguns efeitos colaterais.
Um deles é diagnosticado pelo especialista em cinema Carlos Cipriano, que participou do júri de pré-seleção do festival em 2009. Cipriano foi um dos responsáveis por assistir as 556 obras inscritas e, dentre elas, tirar 29 para a mostra competitiva. Os goianos, que concorrem a prêmios específicos para a produção local, eram 54 no bolo inicial e tiveram apenas quatro obras selecionadas ao final.
Para Cipriano, a existência de uma premiação à parte para a produção goiana incentiva o realizador por um lado, mas leva ao imediatismo e ao oportunismo por outro. "A gente vê muitos trabalhos mal elaborados e mal acabados, devido à pressa de se inscrever para participar do Fica e ganhar algum prêmio", diz. Além disso, Cipriano acredita que a própria definição do que é "cinema goiano" é complexa, já que atualmente muitos filmes são feitos em sistema de coprodução, frequentemente com dois ou três diretores de regiões distintas.
Baseado nisso, ele defende a extinção dos dois prêmios especiais para os melhores filmes goianos - os troféis José Petrillo e João Bennio, que distribuem R$ 40 mil cada um. "Os goianos devem ser bons ao ponto de competir com qualquer sergipano, pernambucano ou carioca", argumenta, acrescentando: "Esse paternalismo ou protecionismo existente hoje não tem levado a nada. Em 11 anos, nada mudou".
Leia a continuação da reportagem publicada na edição 1176 da Tribuna do Planalto. Clique aqui.
3 comentários:
Algumas considerações sobre essa postagem: para iniciar uma pertinente discussão sobre a premiação do FICA, seu texto apresenta trechos da entrevista que concedi lá em Goiás. O recorte de fragmentos desta entrevista instaura um conflito conveniente à matéria, talvez no intuito de gerar polêmica, ao contrapor minha opinião a dos demais entrevistados.
Em um desses fragmentos, defendo a extinção dos dois prêmios para os melhores trabalhos goianos selecionados para a mostra competitiva - os troféus José Petrillo e João Bennio, que distribuem R$ 40 mil cada um. E ponto final. A maneira como esta afirmação foi inserida no texto, desacompanhada dos argumentos que a justificam, visa nitidamente uma polarização funcional e dialética, na qual sou a voz dissonante a ser contestada pelo coro de entrevistados.
Gostaria de esclarecer que, como qualquer realizador audiovisual nascido e criado em Goiânia, enfrento muitas dificuldades para conseguir viabilizar meus projetos. Portanto, seria uma auto-sabotagem absurda a defesa da simples extinção de qualquer incentivo à produção local.
Não posso ficar calado diante da possibilidade de ser injustamente tachado como um Judas arrogante pelos colegas realizadores, já que todos nós dependemos de recursos públicos para concretizar nossos projetos.
O que proponho é que a premiação oferecida aos goianos na mostra competitiva do FICA seja transferida para a mostra da ABD, para que o festival corrija uma distorção nesse propalado e restritivo incentivo à produção local - questionável, já que os dois prêmios mais graúdos oferecidos aos goianos são destinados apenas à temática ambiental. Será essa a melhor forma de incentivar o chamado “cinema goiano”? Percebo que os prêmios funcionam hoje como um incentivo à produção audiovisual preocupada com o meio ambiente, mas ignoram os filmes de temática livre e condicionam o fenômeno das inúmeras produções oportunamente ambientais e mal elaboradas, feitas para ganhar os prêmios do FICA. Um incentivo ilusório, voltado apenas à produção de vários vídeos ambientais - a maioria, muito fraca.
A proposta, se aplicada na prática, vai desestimular essa “indústria” de filmes mal feitos e forçar a inteligência dos goianos, que para participarem da mostra internacional do FICA terão que inscrever trabalhos compatíveis com o nível da competição - como vários trabalhos goianos que já passaram pelo festival, e quero citar o premiado “Rapsódia do Absurdo” como exemplo. Tenho certeza que nenhum júri de seleção deixará de indicar os títulos goianos que mereçam ocupar esta importante vitrine que é a mostra competitiva internacional. E o realizador goiano que for selecionado para o FICA vai se sentir muito mais prestigiado - pois terá a certeza de que esta seleção não ocorreu apenas porque existe a necessidade de indicar os trabalhos locais que concorrerão aos prêmios, da forma paternalista como hoje acontece. As produções goianas concorrerão em pé de igualdade com as produções brasileiras e internacionais, nas categorias de curtas, médias, longas e séries televisivas. Acho que isso sim é que é um estímulo de verdade para a produção local - um estímulo à qualidade das produções, não à quantidade de inscritos.
Para terminar, quero dizer que Ângelo Lima ouviu da minha boca a proposta que defendo acima, sendo creditado na reportagem como o autor da idéia. Repito: não defendo a extinção dos prêmios, mas a transferência dos recursos para a mostra da ABD. Assim como ele, vários outros podem testemunhar que o que defendo não é algo assim tão absurdo, como quer a matéria, pois também ouviram meus argumentos por completo. Podem testemunhar a meu favor: Itamar e Cássia (ABD), Maria Abdala (ICUMAM), Décio Coutinho (SEBRAE), Tânia Mendonça (AGEPEL), Lourival Belém Jr, dentre outros que conversei durante o FICA deste ano.
Carlos Cipriano
Bom, é preciso fazer um esclarecimento para quem visita o blog e lê esse comentário. No mesmo dia em que percebi essa contestação circulando na internet (não só no meu blog, mas também em listas de e-mails), liguei para o realizador Carlos Cipriano a fim de esclarecer o ocorrido e corrigir uma injustiça, que é a seguinte: na entrevista concedida a mim no dia 17 de junho de 2009, na porta do Teatro São Joaquim, em Goiás, Cipriano não citou a proposta de transferência dos recursos da competição oficial do Fica para a mostra da ABD. Ele apenas fez a crítica citada na reportagem (e outras, que não utilizei na matéria porque não quis abrir o foco para assuntos paralelos, como a formação dos realizadores e os espaços para exibição). Revi os originais (tanto o vídeo da entrevista quanto a minha transcrição dele) e posso garantir que o único erro grave cometido por mim nessa reportagem é a grafia incorreta do plural de "troféu". Desse, sim, me arrependo.
Não duvido que Cipriano já tivesse, naquela data, pensado na idéia da transferência de recursos e tenha inclusive comentado a proposta com os realizadores citados por ele (Belém, Abdalla, Coutinho, etc). O que nenhuma dessas pessoas pode provar é que Cipriano me repassou essa informação durante a entrevista. A única coisa que pode provar isso é o vídeo da entrevista e a transcrição dele, que coloco à disposição de qualquer pessoa interessada em esclarecer o ocorrido.
Não acredito que isso seja necessário, porém, já que no contato telefônico entre Cipriano e eu as coisas parecem ter ficado esclarecidas - ele, inclusive, se comprometeu a enviar outra mensagem aos seus contatos corrigindo essa parte da história.
Nesse mesmo contato telefônico, lembrei a Cipriano de nosso encontro no dia seguinte, 18, quando lhe comuniquei da minha disposição de transformar trechos da entrevista em uma reportagem sobre o "cinema goiano". Enumerei, nos dedos da mão esquerda, todos os tópicos da fala dele que eu usaria na matéria. Cipriano aprovou a idéia.
Com a aprovação dele, parti então para fazer outras entrevistas. Lourival Belém Jr, Lisandro Nogueira e Ângelo Lima conversaram comigo na sequência. Nenhum deles, ao contrário do que diz Cipriano na mensagem, deixou de concordar ao menos parcialmente com a argumentação do realizador. Lisandro disse que é favorável a rediscutir a questão da premiação para filmes goianos. Ângelo Lima, além de também tecer uma crítica à forma como a premiação é feita atualmente, me falou então da proposta de se transferir os recursos para a mostra da ABD — daí o motivo de a informação estar na boca dele no texto.
Não há aqui, portanto, como diz Cipriano: "(...) uma polarização funcional e dialética, na qual sou a voz dissonante a ser contestada pelo coro de entrevistados". Quem ler a matéria verá que somente Beto Leão e Francisco Elinaldo Teixeira parecem convencidos de que a coisa deve continuar como está.
Lamento o ocorrido, e não por me sentir incomodado com o questionamento. Lamento por não ter sido ouvido a respeito da questão, antes de se criar um problema que respinga não só na minha imagem, mas na imagem da Tribuna também, que publicou a matéria. Não tenho o menor interesse em utilizar declarações alheias para criar a polêmica pela polêmica e denegrir a imagem de quem quer que seja, dos realizadores ou do festival. Minha intenção, ao fazer a reportagem, era fugir da cobertura factual e comum do Fica, abrindo espaço para uma discussão nova, sobre um tema pouco lembrado e que interessa à comunidade cinematográfica local.
Caro Marco Aurélio,
peço desculpas pela forma precipitada com a qual tentei me defender. Foi uma entrevista apressada, na porta do cinema, e sobre um assunto que conversei com muitos jornalistas, em diferentes momentos - e não me recordava de não ter explicado a idéia por completo para você, no momento em que escrevi minha defesa (e também no dia seguinte ao da entrevista, quando você enumerou os tópicos).
Não gostaria de "manchar" a imagem do seu trabalho, nem a da Tribuna, pois considero que você fez uma das melhores coberturas do FICA deste ano, num trabalho sério. Principalmente por levantar questões como esta, que precisam ser discutidas entre os realizadores locais com urgência.
Acho que você explicou bem o equívoco na réplica e mais uma vez, peço sinceras desculpas pelo mal entendido.
Carlos Cipriano
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